Águas e velas
- Paula Rossi
- 10 de mai. de 2024
- 1 min de leitura
Seu avião acabou de partir, mas fiquei com uma vontade imensa de te escrever, são coisas que acabei não dizendo porque estava muito ocupada pensando se você iria me ligar quando chegasse em casa, enquanto comprava aquela água superfaturada do aeroporto.
Na loja de presentes você perguntou por que eu estava levando mais velas se já tinha tantas e eu te disse que gostava do cheiro da canela, mas na verdade tenho essa mania de me preparar para o fim das coisas antes mesmo que elas acabem, esse hábito que me consome e faz com que eu sempre carregue na bolsa um arsenal de comprimidos sublinguais.
O que eu queria dizer é que vou sentir uma falta enorme das coisas triviais, como comprar águas e velas. Às vezes, durante a insônia, me pergunto se você enxerga a mesma linha do tempo que eu, ou se estamos condenados a existir em estações opostas, nunca sincronizadas.
Naquela noite em que nos sentamos na escada do parque e nos fotografamos com a câmera analógica, você viu beleza na minha vulnerabilidade, será que era um sinal? Você nunca fez promessas, apenas sussurros de possibilidades incertas, enquanto eu desejava que fôssemos uma história densa, um épico romântico, você parecia contente em ser apenas um poema breve.
Talvez seja melhor assim, sem mensagens não enviadas, sem chamadas não atendidas. Mas como posso me preparar para um desfecho quando não sei qual é o enredo?
Seu avião acabou de partir, mas fiquei com uma vontade imensa de dizer tantas coisas.